Uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) foi protocolada pelo PT de São Paulo na Justiça paulista para questionar a validade da lei que autoriza a privatização da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp). O partido argumenta no pedido que a Lei 17.853 afronta artigos da Constituição Estadual de 1989, além de violações ao processo legislativo.
A ADI pede que seja concedida liminar para suspender a eficácia da lei até que seja feito o julgamento final da ação. Um dos pontos questionados está no artigo 216, que diz que “o Estado assegurará condições para a correta operação, necessária ampliação e eficiente administração dos serviços de saneamento básico prestados por concessionária sob seu controle acionário”.
“O artigo reza que serviço deve ser prestado por empresa pública”, argumenta o deputado paulista Maurici (PT). A assessoria dele auxiliou na formulação da ação. Para o deputado, o governo estadual deveria ter encaminhado uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) sobre o tema.
De acordo com a Constituição Estadual, a ADI pode ser proposta pelo governador, pela Mesa da Assembleia Legislativa, pelo prefeito, pela Mesa da Câmara Municipal, pelo Procurador-Geral de Justiça, pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) seção estadual, entidades de classe e partidos políticos com representação na Assembleia.
A ação também questiona aspectos relacionados ao processo legislativo. “[O texto] não passou pela Comissão de Meio Ambiente, não passou pela Comissão de Assuntos Metropolitanos e Municipais. Só passou na Comissão de Constituição e Justiça e Finanças e Orçamento”, alega o petista Maurici.
O deputado alega ainda que a lei foi aprovada em sessão interrompida por ação policial contra manifestantes com uso de gás lacrimogêneo. Segundo ele, deputados idosos e gestantes ficaram impedidos de participar da votação.
Contudo, a ação da polícia começou após manifestantes forçarem o acrílico que separa o público dos deputados da Alesp.
A Mesa Diretora da Alesp disse, por meio da assessoria de imprensa, que não foi notificada da ação. A Sabesp informou que o processo de desestatização é conduzido pelo governo estadual. O governo Tarcísio também não se manifestou.
O projeto
Os parlamentares da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo aprovaram, em sessão extraordinária realizada na quarta-feira (6/12), o projeto que autoriza o Governo do Estado a realizar medidas de desestatização da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp). A proposta foi aprovada com 62 votos favoráveis e 1 contrário.
Encaminhado para a análise do Poder Legislativo pelo governador Tarcísio de Freitas, o Projeto de Lei 1.501/2023 buscava a autorização do Parlamento para que o Executivo possa negociar sua participação acionária na companhia e, assim, transferir o controle operacional da empresa à iniciativa privada. Atualmente, o Estado detém 50,3% do capital da empresa.
Investimentos e fundo para a universalização
A principal premissa da proposta reside na ampliação do acesso ao saneamento básico para a população paulista a partir da transferência de gestão e maior participação de investimentos privados na companhia.
O Governo pretende antecipar em quatro anos a universalização do saneamento básico – que, de acordo com o Marco Legal do Saneamento, aprovado pelo Congresso Nacional em 2020, deve ser alcançada até 2033. De acordo com o texto do projeto, com a desestatização, a Sabesp terá R$ 10 bilhões a mais em investimentos durante o período.
O projeto de lei aprovado também estabelece que uma parte dos recursos gerados no processo de desestatização seja revertida em obras de saneamento básico e na redução da tarifa para os consumidores. O texto legal prevê que pelo menos 30% do valor líquido da operação seja destinado a essa área, verba que deverá ser aplicada no Fundo de Apoio à Universalização do Saneamento no Estado de São Paulo (Fausp).
Tramitação
A proposta deu entrada na Casa em 18 de outubro deste ano e tramitou em regime de urgência. Durante a tramitação, o projeto recebeu 173 emendas parlamentares que buscavam acrescentar ou alterar dispositivos da matéria e quatro substitutivos, todos contrários à desestatização da companhia.
A discussão que culminou na aprovação da proposta do governo Tarcísio teve início ainda em novembro, em reunião conjunta das comissões de Constituição, Justiça e Redação; Finanças, Orçamento e Planejamento; e Infraestrutura da Alesp.
O grupo colegiado aprovou o relatório do deputado Barros Munhoz (PSDB) que, além de ser favorável a desestatização da Sabesp, incorporou 26 emendas parlamentares ao texto do projeto – com destaque para a garantia da estabilidade dos atuais servidores da companhia por um período de seis meses após a efetiva desestatização da empresa.
Antes de ser pautada em Plenário, a proposta foi tema de uma audiência pública convocada pelo presidente da Alesp, deputado André do Prado, e realizada no Plenário Juscelino Kubitschek. O evento contou com a presença de pessoas e grupos organizados favoráveis e contrários à medida.
Durante a última sessão realizada na quarta-feira (6), a votação chegou a ser suspensa e a galeria esvaziada, após uma parte dos manifestantes comprometer a segurança e entrar em confronto com a Polícia Militar. A discussão da proposta foi retomada após o restabelecimento da ordem.
Discussão em Plenário
No Plenário, o processo de discussão e votação da matéria se arrastou por três dias, tendo começado na última segunda-feira (4), e foi marcado pelos posicionamentos dos deputados de diferentes partidos e opiniões.
Durante os encaminhamentos da votação, o deputado Barros Munhoz (PSDB) defendeu a medida, como importante para melhorias na qualidade de vida da população. “Vamos […] confiar no Tarcísio, que é um grande governador, que tem uma história de vida, que não faria uma aventura. Está fazendo algo difícil, mas que é pelo bem de São Paulo”, disse.
O líder do Governo na Alesp, deputado Jorge Wilson ‘Xerife do Consumidor’ (Republicanos), enalteceu a medida e agradeceu o apoio dos pares. “Esses deputados que estão aqui têm compromisso com o cidadão paulista. Querem levar serviços públicos de qualidade também para a população que ainda não tem serviços de qualidade.”
Já os parlamentares contrários à medida, questionaram pontos prometidos pelo projeto, como a redução da tarifa e a antecipação da universalização do saneamento. “O Estado pretende utilizar parte do dinheiro arrecadado com a venda da própria Sabesp para subsidiar a tarifa. Tal projeto não mostra sustentabilidade por si só, já que o dinheiro é finito”, afirmou o deputado petista Reis (PT).
Para a deputada Andréa Werner (PSB), a transferência do controle da Sabesp para a iniciativa privada pode ser negativa para a população. “A Sabesp combina dois pontos essenciais, que, sob a perspectiva do mercado, são a receita da catástrofe. Um deles é que o que ela oferece é água e saneamento básico, que é um bem essencial. O outro é que a Sabesp é um monopólio e a gente vai estar falando de privatizar um monopólio”, disse.
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