O Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, pode até ter demonstrado entusiasmo com a proposta apresentada nessa semana por sua pasta, mas setores do mercado já começam a levantar desconfiança a respeito do ‘arcabouço fiscal’ do petista.
Neste domingo (2), por exemplo, o ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore afirmou, em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, que desenho do projeto ‘levará a uma alta brutal da carga tributária” no Brasil. Para chegar a essa conclusão, ele tomou como base um artigo bastante denso publicado no portal sobre economia e negócios ‘Brazil Journal’. O texto realizou simulações do arcabouço usando a expectativa de crescimento do PIB de acordo com o boletim Focus (divulgado toda semana). Clique AQUI para ver.
“Pelo que se pode inferir com base em uma apresentação em PowerPoint, o ajuste fiscal requer um aumento da carga tributária. O ministro da Fazenda mencionou ampliar a arrecadação em cerca de R$ 150 bilhões. Infelizmente, a equipe não deixou claro quais medidas serão adotadas para esse fim.”, diz o artigo citado pelo ex-BC.
Segundo Pastores, “o propósito do arcabouço é chegar a um superávit primário que permita reduzir a relação dívida/PIB. A única forma, com esse arcabouço, de alcançar resultados primários que reduzam essa relação é ter um enorme aumento de carga tributária. Estou pegando uma simulação feita pelo Marcos Lisboa e pelo Marcos Mendes (publicada no Brazil Journal) que aponta um aumento da ordem de 5,2 pontos de porcentagem do PIB. Isso não é factível. Esse arcabouço tem uma aritmética impecável, na qual o ministro Haddad conseguiu provar que, se a despesa crescer menos do que a receita, ele gera superávits primários, mas tem uma economia falha, que não garante o resultado.”, diz o economista.
Ainda segundo ele, “o objetivo do governo é aumentar gasto. Eu acho que esse objetivo ele atinge. Agora, não atinge o objetivo de reduzir a relação dívida/PIB.”.
Na entrevista, ele também questiona de onde viria essa aumento elevado de impostos ao qual Haddad precisaria recorrer para conseguiu o objetivo de seu arcabouço, teoricamente o de reduzir a dívida pública: “Os R$ 150 bilhões que o governo quer aumentar de arrecadação, talvez, ele consiga com isso, com tributação das apostas eletrônicas, etc. Agora, precisaria de uma arrecadação de 5% ao ano a mais nos anos seguinte. Aí teria de ir para as renúncias tributárias. Nós vamos ter de aumentar a carga tributária e a pergunta que fica para, talvez, o ministro responder é quem ele vai escolher para subir a carga.”.
E concluiu: “Se o governo aprovar esse arcabouço, ele obtém uma licença para aumentar gastos. Se ele não aumentar a carga tributária, o superávit primário não vai ser gerado. Se o superávit primário não for gerado, vamos para dois cenários: ou sobe a inflação que aumenta a receita e faz cair a despesa em termos reais ou vira uma desaceleração adicional do crescimento econômico, porque o Banco Central, mantendo a sua independência, continua com uma política restritiva.”.
Affonso Celso Pastore
Nasceu em São Paulo (19 de junho de 1939) e é economista formado pela Universidade de São Paulo, onde também fez seu doutorado. Atuou como professor da USP, INSPER e da Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro, e hoje é consultor na área de economia.
Foi secretário da Fazenda do estado de São Paulo de 1979 a 1983, e presidente do Banco Central do Brasil de 1983 a 1985, durante o período militar no governo de João Figueiredo. Escreveu diversos artigos e livros e tem uma obra extensa sobre câmbio e inflação.