A Itaipu Binacional reintegrou ao quadro de empregados da empresa, nessa segunda-feira (10), a tradutora e secretária bilíngue Sonia Lúcia Castanheira, demitida em fevereiro de 1977, por ordens do governo brasileiro da época, comandado pelo general João Baptista Figueiredo.
A reintegração aconteceu 46 anos depois da demissão, cujo desligamento foi assinado pelo general Costa Cavalcanti, então diretor-geral brasileiro da usina.
Além do antigo emprego de volta, Sonia, hoje com 78 anos, também receberá uma indenização da empresa e terá direito aos benefícios oferecidos por ela, como assistência média e odontológica.
“Fui demitida sem saber se havia cometido algum erro, se era pelo meu desempenho. Somente em 2009, com a abertura dos arquivos da ditadura militar, descobri que a causa era política”, declarou.
Ela passou por exames admissionais e, em seguida, foi recepcionada pelo diretor-geral brasileiro, Enio Verri, e pelo diretor Jurídico, Luiz Fernando Delazari. No retorno, estava acompanhada de seus filhos, Mauricio Castanheira e Claudia Castanheira, e dos advogados, Daniel Godoy e Andrea Godoy.
“Minha maior alegria é estar viva neste momento, em que a injustiça cometida contra mim e a minha família é reconhecida”, disse. “Não guardo rancor da Itaipu, eu amava a empresa e não entendia se eu tinha falhado ou o que poderia ter feito de errado”, relatou.
Para Enio Verri, que entregou em mãos o crachá funcional de Sonia, a reintegração da empregada é uma marca na história da Itaipu, que a cada período reflete o Estado brasileiro, atualmente “marcado pela presença de um governo democrático, preocupado em preservar a história e fortalecer a democracia”.
O diretor-geral brasileiro enfatizou que a medida “é um gesto de respeito à profissional, ao próprio Estado democrático de direito, à Constituição brasileira e àqueles que sempre lutaram por um país mais justo e igualitário”, afirmou.
Elogios e dossiê
Sônia disse que costumava receber elogios em relação ao seu trabalho. Ao questionar diretamente o general Costa Cavalcanti, recebeu como resposta: “são ordens superiores”. “Eu não era a favor da ditadura, mas nunca participei de nenhuma atividade contrária ao governo”, afirma.
Sonia Castanheira só descobriu o motivo de sua demissão em 2009, quando os arquivos secretos do governo militar foram abertos. “Fui em busca de uma explicação, e achei uma carta sobre meu desligamento. Meu marido trabalhava na Unicon [prestadora de serviços da Itaipu] e foi demitido antes de mim, em 1976”, relembra. “Uma mulher nos acusou de estarmos envolvidos em atividades contrárias à repressão. Nós nunca fizemos nada”.
Em carta endereçada ao então chefe do Serviço Nacional de Inteligência (SNI), general Figueiredo, o general Costa Cavalcanti comunicou as providências adotadas após receber uma documentação a respeito de Sonia e seu marido, Dario Anibal Galindo.
No texto, informava ao mandatário que, com base nas “conclusões resultantes de documentos biográficos produzidos pela Assessoria de Segurança desta Entidade, em relação aos antecedentes dos citados”, ambos foram demitidos de seus cargos em 17 de novembro de 1976 e 15 de fevereiro de 1977, relevando “a oportunidade das medidas tomadas”.
Sonia acredita que uma das razões para a demissão tenha sido o fato de ter morado no Conjunto Residencial da Universidade de São Paulo (USP), conhecido como Crusp, precisamente em 1965. Naquele ano, aqueles estudantes promoveram uma greve no alojamento, cujas alegações eram o aumento do preço das refeições e da moradia. “Fizeram um dossiê sobre mim, no qual constava que eu era moradora do Crusp”.
Em 2012, ela teve acesso ao relatório completo e entrou com uma ação trabalhista na 1ª Vara do Trabalho de Foz do Iguaçu, buscando o reconhecimento de seu vínculo empregatício. A sentença favorável à autora foi concedida em 2017 pela juíza do Trabalho Erica Yumi Okimura. Na ocasião, como de praxe em ações trabalhistas, Itaipu recorreu da decisão, mas agora acata a determinação judicial.