O Supremo Tribunal Federal (STF) anulou o decreto do ex-presidente Jair Bolsonaro que havia concedido indulto individual ao ex-deputado Daniel Silveira, condenado a oito anos e nove meses por falas contra o STF.
Por maioria, o colegiado acompanhou o voto da presidente do STF, ministra Rosa Weber (relatora), no sentido de que houve ‘desvio de finalidade’ na concessão do benefício apenas porque o ex-deputado era aliado político de Bolsonaro. O julgamento foi concluído na sessão desta quarta-feira (10), com os votos dos ministros Gilmar Mendes e Luiz Fux (os demais já tinham votado).
Caso
Em 20 de abril de 2022, o ex-parlamentar foi condenado pelo STF, na Ação Penal (AP) 1044, a oito anos e nove meses de reclusão, em regime inicial fechado, por crimes de ‘ameaça ao Estado Democrático de Direito’ e ‘coação no curso do processo’.
No dia seguinte, Bolsonaro concedeu o indulto, apontando que haveria comoção social pela condenação de Silveira, que “somente fez uso de sua liberdade de expressão”.
A validade do indulto foi questionada em quatro Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs 964, 965, 966 e 967), apresentadas pela Rede Sustentabilidade, pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), pelo Cidadania e pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), respectivamente.
‘Vínculo de afinidade’
Em seu voto, apresentado na sessão da última quarta-feira (3), a ministra Rosa Weber lembrou que o entendimento prevalecente no STF é que, embora o indulto individual, ou graça, seja um ato político privativo do presidente da República, ‘é possível’ que o Judiciário verifique se sua concessão está de acordo com as normas constitucionais.
No caso de Silveira, ela alegou que o benefício foi concedido por simples vínculo de afinidade político-ideológico, o que é incompatível com os princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade administrativa.
Na ocasião, a ministra afirmou que a concessão de indultos deve observar o ‘interesse público’, e não pessoal, pois isso representaria a instrumentalização do Estado, de suas instituições e de seus agentes pelo presidente da República para obter benefícios pessoais “de modo ilícito, ilegítimo e imoral”.
Crime político
Ao acompanhar a relatora pela anulação do indulto, o ministro Luiz Fux afirmou que as ameaças proferidas pelo ex-deputado configuram crime político, contra o Estado Democrático de Direito, e, por este motivo, não é passível de indulto ou anistia.
Expedientes subversivos
No mesmo sentido, o ministro Gilmar Mendes afirmou que o decreto foi assinado sem nenhuma motivação idônea. Segundo ele, a concessão do indulto fez parte de uma campanha contra os Poderes constitucionais, avalizando ameaças graves contra a vida e a segurança de integrantes do STF.
Para o ministro, o decreto foi uma “peça vulgar de puro proselitismo político, cujo efeito prático é o de validar expedientes subversivos praticados pelo agraciado em detrimento do funcionamento de instituições centrais da democracia”.
Divergências
Divergiram os ministros Nunes Marques e André Mendonça. Ao abrir divergência, Mendonça considerou que a concessão de indulto é um ato político e, por esse motivo, não é passível de controle pelo Judiciário.
Como apontou, o poder do presidente da República para concedê-lo é limitado unicamente pela proibição constitucional expressa de que o benefício atinja pessoas condenadas por crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e os crimes definidos como hediondos, o que não era o caso de Daniel Silveira. Mendonça também pontuou que a pena a Silveira foi exagerada.
O ministro Nunes Marques também julgou válido o indulto a Silveira. Ele entende que, por ser ato discricionário do presidente da República, sua revisão pelo Judiciário se limita apenas aos casos expressamente previstos na Constituição Federal.
Revisão da pena
Silveira está na penitenciária Bangu 8, no Rio, onde cumpre prisão preventiva desde fevereiro por descumprir medidas cautelares impostas pelo Supremo, como o uso de tornozeleira. É provável que ele cumpra a pena na mesma unidade prisional, mas a definição caberá a Moraes.
A defesa do ex-deputado o ex-deputado deve apresentar uma ação no STF para tentar rever a sua pena de prisão e anular a condenação. Entretanto, assume que é remota a chance de êxito.
Em posicionamento ao UOL, o advogado Paulo Faria, que defende Silveira, afirmou: “esse julgamento [do STF] é tão verdadeiro, legal e constitucional quanto uma nota de R$ 3,99”.