O governo Lula oficializou a suspensão do cronograma de implementação do Novo Ensino Médio. A decisão será publicada em portaria do Ministério da Educação (MEC) no Diário Oficial da União (DOU), mas já foi antecipada pelo titular da pasta, Camilo Santana, em entrevista a jornalistas, na tarde desta terça-feira (4), em Brasília.
“Nós reconhecemos que não houve um diálogo mais aprofundado da sua implementação, não houve uma coordenação por parte do Ministério da Educação. O ministério foi omisso, principalmente no período difícil que foi a pandemia nesse país, e há a necessidade de a gente poder rever toda essa discussão”, afirmou Santana.
Mais cedo, ele se reuniu com Lula, no Palácio do Planalto, onde discutiu o assunto. Esta nova portaria suspenderá por 60 dias todos os prazos de uma outra portaria editada em 2021, também pelo MEC, incluindo o prazo para que o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) atualizasse as mudanças de avaliação com base no Novo Ensino Médio.
A revogação do Novo Ensino Médio acontece por pressão de entidades estudantis e sindicatos. No início do mês passado, o MEC abriu consulta pública para avaliação e reestruturação da política nacional de ensino médio, que ainda deve durar cerca de dois meses, com possibilidade de prorrogação.
“Essa comissão está se reunindo, teve quatro reuniões, nós estamos num processo de consulta, de discussão, para que a gente possa aperfeiçoar e melhorar todo o ensino médio”, alegou o ministro, dizendo que essa revisão incorpora a participação de ‘amplos setores’ da sociedade e dos governos.
“De forma democrática, vamos ouvir as entidades, vamos ouvir os estados que executam as políticas, vamos ouvir os professores, as entidades estudantis, para que a gente possa tomar decisões com responsabilidade”, diz.
Para o ministro da Educação, não houve ‘orientação adequada’ na formação de professores nem adaptação de infraestrutura necessária nas escolas. “Não se faz uma mudança no ensino médio de um país de uma hora para outra. Isso é um processo”.
Novo Ensino Médio
A atual política do Ensino Médio foi criada pela Lei 13.415 de 2017, no governo de Michel Temer, com o objetivo de tornar a etapa mais atrativa, implantar o ensino integral e evitar que os estudantes abandonem os estudos.
Com o modelo, parte das aulas deverá ser comum a todos os estudantes do país, direcionada pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Na outra parte da formação, os próprios alunos poderão escolher um itinerário para aprofundar o aprendizado.
Entre as opções, está dar ênfase às áreas de linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas ou ao ensino técnico. A oferta de itinerários, entretanto, depende da capacidade das redes de ensino e das escolas.
A implementação ocorre de forma escalonada até 2024. Em 2022, começou pelo 1º ano do ensino médio com a ampliação da carga horária para, pelo menos, cinco horas diárias. Neste ano estava em curso a adoção pelo 2º ano e, em 2024, a reforma chegaria ao 3º ano e ao Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Entre as principais mudanças propostas pelo Novo Ensino Médio (NEM) estão:
– a possibilidade de o aluno poder escolher parte das disciplinas;
– o aumento da carga horária escolar de 2.400 para 3.000 horas;
– uma visão mais voltada para o mercado de trabalho em vez de um currículo que sirva de preparação para o ensino superior.
Pela lei, para que o novo modelo seja possível, as escolas devem ampliar a carga horária para 1,4 mil horas anuais, o que equivale a sete horas diárias. Isso deve ocorrer aos poucos.
Segundo dados do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), mesmo em meio à pandemia de covid-19, as secretarias estaduais mantiveram o cronograma e todos os estados já estão com os referenciais curriculares do novo ensino médio homologados.
Sobre o Enem, Camilo Santana explicou que nenhuma alteração na prova ocorrerá este ano, como já estava previsto, e que eventuais mudanças na prova para 2024, quando os três anos do Novo Ensino Médio estiverem implantados nas redes de ensino, serão definidas após a discussão dessa comissão criada pelo MEC. Como o ano letivo já está em andamento, e 2023 corresponde à implantação do Novo Ensino Médio para alunos do segundo ano, não há mudanças imediatas para as escolas que já promoveram as adaptações.
Últimas colocações
Um dos objetivos da reforma educacional implantada por tema também era recuperar a qualidade do ensino brasileiro, atualmente ocupando as últimas posições o ranking do Pisa.
Atualmente, o patamar do Brasil deve ser comparável em leitura com a Bulgária, a Jordânia, a Malásia e a Colômbia. Em matemática, com a Argentina e a Indonésia. Já em ciências, os países que estão no mesmo grupo do Brasil no ranking mundial são Peru, Argentina, Bósnia e Herzegovina e a região de Baku, no Azerbaijão.
Em 2019 refletindo dados de 2018, o Brasil não conseguiu registrar avanços no desempenho dos estudantes em leitura, em matemática e em ciências no mais importante ranking mundial de educação. O resultado do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) apontou ligeiro aumento da nota média, mas os estudantes brasileiros seguem entre os últimos 10 colocados na prova de matemática.
Soletre ‘retrocesso’
A decisão do governo petista foi criticada até pelo apresentador Luciano Huck, da Rede Globo. Huck, que era um dos críticos ferozes do governo Bolsonaro e que viu a reforma ser iniciada na gestão passada, afirmou: “O Novo Ensino Médio deveria estar acima de diferenças ideológicas. Mesmo c/ difícil implementação, não faz sentido retroceder à estaca zero. O esforço p/ oferecer uma escola mais atrativa p/ os alunos e conectada c/ as suas expectativas de vida e carreira deve ser permanente.”.
O Novo Ensino Médio deveria estar acima de diferenças ideológicas. Mesmo c/ difícil implementação, não faz sentido retroceder à estaca zero. O esforço p/ oferecer uma escola mais atrativa p/ os alunos e conectada c/ as suas expectativas de vida e carreira deve ser permanente.
— Luciano Huck (@LucianoHuck) April 3, 2023
Fonte e foto: Agência Brasil