Lula apresenta ‘PEC da Segurança Pública’ a governadores, mas ouve reclamações

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Luiz Inácio Lula da Silva (PT) esteve em reunião com governadores nessa quinta-feira (31) no Palácio do Planalto, em Brasília, para apresentar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Segurança Pública.

“Eu queria que essa reunião fosse uma reunião em que os governadores não tivessem nenhuma preocupação de falar aquilo que entenderem que devam falar. É uma reunião em que não existe censura, não existe impedimento de cada um dizer aquilo que pensa, aquilo que ele acha que é verdade e, sobretudo, também fazer alguma proposta de solução para que a gente possa dar encaminhamento nesse assunto”, disse Lula no início do encontro.



De acordo com o ministro da Justiça e da Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, o texto da Constituição Federal de 1988 “precisa ser aprimorado” para “dar um cunho federativo” ao combate ao crime organizado. A proposta é alterar a redação dos artigos 21, 22, 23 e 24 – que tratam das competências da União, privativas ou em comum com os estados, municípios e Distrito Federal – e o artigo 144 “que estabelece em detalhes quais são os órgãos que integram o sistema de segurança pública brasileira”, descreveu o ministro.



Se aprovado no Congresso Nacional, o governo federal deverá atuar em conjunto com estados e municípios. Um conselho nacional formado pelos três entes federativos deverá estabelecer normas gerais para as forças de segurança. Poderá, por exemplo, definir normas administrativas para o sistema penitenciário e regulamentar o uso de câmeras corporais. O governo federal garante que a PEC não retira competências e nem fere autonomia dos demais entes federativos.

Tripé da PEC
A proposta do governo tem como tripé aumentar as atribuições da Polícia Federal (PF) e da Polícia Rodoviária Federal (PRF), dar status constitucional ao Sistema Único de Segurança Pública (Susp), criado por lei ordinária em 2018 (Lei 13.675) e também levar para a Constituição Federal as normas do Fundo Nacional de Segurança Pública e Política Penitenciária, unificando os atuais Fundo Nacional de Segurança Pública e o Fundo Penitenciário.

Outra proposta é dar simetria às polícias nacionais e estaduais. Na proposta, a União teria, como os estados, forças de polícia judiciária (como a civil) e ostensivas (militar), como dar poder de Polícia Militar à PRF (Polícia Rodoviária Federal).



De acordo com o texto da PEC apresentado aos governadores, a PRF passa a se chamar Polícia Ostensiva Federal, destinada ao patrulhamento de rodovias, ferrovias e hidrovias federais. Autorizada, a nova policia também poderá proteger bens, serviços e instalações federais; e ”prestar auxílio, emergencial e temporário, às forças de segurança estaduais ou distritais, quando requerido por seus governadores.”



No caso da Polícia Federal, ela passará a ser destinada a “apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União, inclusive em matas, florestas, áreas de preservação, ou unidades de conservação, ou ainda de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, como as cometidas por organizações criminosas e milícias privadas.” Lewandowski pondera as mudanças na PF e atual PRF atualizam o que já ocorre “na prática”.



A PEC assinala que o Fundo Nacional de Segurança Pública e Política Penitenciária não poderá ser contingenciado e terá o objetivo de “garantir recursos para apoiar projetos, atividades e ações em conformidade com a política nacional de segurança pública e defesa social.”

Padronização
O governo federal ainda quer uniformizar protocolos de segurança como boletins de ocorrência e certidões de antecedentes criminais, e a geração de informações e dados estatísticos. Segundo Ricardo Lewandowski, a intenção é “padronizar a língua mas cada estado no seu sistema”, como foi feito no Poder Judiciário para compartilhar e alimentar a mesma base de dados.



Na apresentação aos governadores, o ministro garantiu que a PEC “não centraliza o uso de sistemas de tecnologia da informação; não intervém no comando das polícias estaduais; não diminui a atual competência dos estados e municípios; e não cria novos cargos públicos.”

O governo defendeu a necessidade de mudar a Constituição argumentando que “a natureza da criminalidade mudou. Deixou de ser apenas local para ser também interestadual e transnacional.”



“Se no passado eram as gangues de bairro, o bandido isolado, violento que existia em uma cidade ou outra, em um estado ou outro, hoje nós estamos falando de uma organização criminosa que ganha contornos rápidos de organização mafiosa no Brasil, já que eles não só estão no crime, mas estão migrando para a economia real. Estão dando cursos de formação para concursos de polícia militar e da polícia civil. Estão participando no financiamento das campanhas eleitorais”, acrescentou Rui Costa, ministro-chefe da Casa Civil.

Trâmites
O governo admite que a PEC poderá ser modificada após as contribuições dos governadores antes de ser encaminhada ao Poder Legislativo.

Em regra, uma proposta de emenda constitucional deve ser avaliada separadamente nas duas casas do Congresso Nacional- a Câmara dos Deputados e o Senado Federa, sucessivamente. Em cada casa, deverá ser submetida às comissões de Constituição e Justiça para verificar admissibilidade.



Se aceita, a PEC deverá ser discutida em comissão especial. Aprovada, vai para o Plenário. Tanto na Câmara como no Senado, para ser aprovada a PEC tem ter ao menos três quintos dos votos em dois turnos de votação. No mínimo, 308 votos favoráveis dos deputados federais e 49 votos favoráveis dos senadores. Para aprovação nas duas casas, o governo precisará de votos favoráveis da oposição.

Críticas e sugestões
Todos os 27 governadores foram convidados, 18 compareceram. Jorginho Melo (PL-SC) e Romeu Zema (Novo-MG) foram alguns dos faltantes.

Parte dos governadores pediu maior independência dos estados. “Nós somos um país muito grande e muito diferente. O problema meu não é o do Piauí, que não é o do Amazonas, que não é o do Rio Grande. Nós temos problemas regionais muito mais relevantes”, disse o fluminense Cláudio Castro (PL).



De oposição, Tarcísio de Freitas (Republicanos), de São Paulo, e Ronaldo Caiado (União), de Goiás, foram no mesmo tom. “Senhor presidente, faça a PEC, [mas] transfira cada governador a prerrogativa de legislar sobre aquilo que é legislação penal e legislação penitenciária”, sugeriu o governador paulista.

Tarcísio também pediu ajuda integrada do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) para combate à lavagem de dinheiro pelas facções. “Falta mais acesso às informações que são produzidas no Coaf. E aí, a inteligência, o ‘follow the money’ é o que vai, eventualmente, ter mais sucesso”, afirmou o governador. À imprensa, ele disse que o texto “não está pronto”, mas elogiou ser “um primeiro passo”. “Saio otimista”, completou.

Barrar a PEC e ironia
O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União), fez as principais críticas à proposta. Em determinado momento do encontro, Caiado disse que teme uma eventual perda de prerrogativas das forças de segurança estaduais. Isso porque a PEC prevê dar mais poderes para a Polícia Federal e também criar uma nova polícia ostensiva, como a polícia militar, mas sob a alçada da União.



“Inadmissível qualquer invasão nas posições que os estados têm em termos de poder da sua polícia civil, militar e penal, que realmente são as estruturas que sustentam a segurança nesse país, com total parceria com a PF e a PRF”, afirmou o governador de Goiás.



Ele também argumentou que Goiás não tinha problemas de segurança na mesma proporção que outros estados do país e que o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) não pode ser confundido com o Sistema Único de Saúde (SUS) ou o sistema de educação. O projeto está previsto na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública que foi apresentada a vários governadores em reunião no Palácio do Planalto.

O chefe do Executivo estadual de Goiás elogiou a iniciativa de Luiz Inácio Lula da Silva em convocar a reunião, mas disse que o governo tem de “buscar não só experiências teóricas, mas práticas”. “A teoria é muito fácil, mas a praticidade é totalmente diferente. Se partirmos de premissas erradas, vamos chegar a conclusões erradas. Com todo o respeito, mas o SUS e sistema de educação não podem ser confundidos com SUSP, são coisas distintas”, completou.



“Eu trato a pneumonia, câncer e fratura exposta de forma igual em qualquer Estado. Busco a educação de qualidade, alfabetização em qualquer município e Estado. Agora, segurança pública tem peculiaridades. Conheço a segurança pública de Goiás, mas não conheço na Amazônia, não sei como tratar em região de fronteira, no litoral”, disse o governador a ministros e outros governadores para discutir a PEC.



Mais tarde, Lula ironizou: “O dado concreto é que é uma situação muito complicada no Brasil inteiro. Eu tive a oportunidade de conhecer hoje o único estado que não tem problema de segurança, que é o estado de Goiás. Que eu peço pro Lewamdowski [ministro da Justiça] ir lá levantar, que pode ser referência para os outros governadores. Em vez de eu ter chamado, era o Caiado que tinha que ter chamado a reunião para orientar como é que se comporta, para gente acabar com o problema da segurança em cada estado”, afirmou o presidente.

Após a fala do presidente, em conversa com jornalistas, Caiado foi questionado sobre a ironia do presidente: “Não é um assunto para ser discutido nesse nível. Não cabe ironia”. Ele também garantiu que irá trabalhar para barrar a PEC. Assista abaixo às crítica do governador em conversa com a imprensa. (Foto: Palácio do Planalto; Fontes: EBC; G1; UOL; A Redação; CNN)

 

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