A Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei dos “combustíveis do futuro”, que cria programas nacionais de diesel verde, de combustível sustentável para aviação e de biometano, além de aumentar a mistura de etanol e de biodiesel à gasolina e ao diesel, respectivamente. A proposta será enviada ao Senado. Foram 429 votos a favor do PL do “Combustível do Futuro” e 19 contra.
O texto aprovado nessa quarta-feira (13) é um substitutivo do deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP – foto acima) para o Projeto de Lei 528/20, do ex-deputado Jerônimo Goergen, tomando como base o PL 4516/23, do Poder Executivo (governo federal).
A partir da publicação da proposta como lei, a nova margem de mistura de etanol à gasolina passará de 22% a 27%, podendo chegar a 35%. Atualmente, a mistura pode chegar a 27,5%, sendo, no mínimo, de 18% de etanol.
Quanto ao biodiesel, misturado ao diesel de origem fóssil no percentual de 14% desde março deste ano, a partir de 2025 será acrescentado 1 ponto percentual de mistura anualmente até atingir 20% em março de 2030, segundo metas propostas no texto.
Entretanto, a adição deve considerar o volume total, e caberá ao Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) avaliar a viabilidade das metas de aumento da mistura, reduzir ou aumentar a mistura de biodiesel em até 2 pontos percentuais. A partir de 2031, o conselho poderá elevar a mistura, que deverá ficar entre 13% e 25%.
Um regulamento definirá metodologia para a adoção de um sistema de rastreamento dos combustíveis do ciclo diesel em todos os elos da cadeia produtiva a fim de assegurar a qualidade.
A adição voluntária de biodiesel em percentual superior ao fixado será permitida para determinados usuários listados no projeto, devendo isso ser informado à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP):
• transporte público;
• transporte ferroviário;
• navegação interior e marítima;
• frotas cativas;
• equipamentos e veículos usados em extração mineral;
• na geração de energia elétrica; e
• tratores e maquinários usados na agricultura.
Outra novidade em relação à matriz energética atual é que a ANP terá poder de ‘regulação’ e ‘fiscalização’ sobre os combustíveis sintéticos e a estocagem geológica de gás carbônico, assim como contratar a atividade.
O projeto também autoriza a Petrobras a atuar nas atividades de movimentação e estocagem de gás carbônico, de transição energética e de economia de baixo carbono.
‘Diesel verde’
Quanto ao ‘Programa Nacional do Diesel Verde’ (PNDV), também pensado para incentivar a pesquisa, a produção, a comercialização e o uso desse biocombustível, o CNPE fixará, a cada ano, até 2037, a quantidade mínima, em volume, de diesel verde a ser adicionado ao diesel de origem fóssil.
Esse adicional deverá ser, no mínimo, de 3% por volume e levará em conta a comercialização em todo o território nacional.
Para definir esse volume mínimo, o conselho deverá analisar as condições de oferta de diesel verde, incluídas a disponibilidade de matéria-prima, a capacidade e a localização da produção; o impacto da participação mínima obrigatória no preço ao consumidor final; e a competitividade nos mercados internacionais do diesel verde produzido no Brasil.
Como a mistura, em termos de volume, deve ser alcançada nacionalmente, a ANP definirá os percentuais de adição para cada estado e Distrito Federal, podendo ser diferentes conforme diretrizes como a otimização logística na distribuição e no uso do diesel verde e a adoção de mecanismos baseados em mercado.
Frequentemente, o diesel verde é confundido com o biodiesel, mas são propriedades distintas. Enquanto o biodiesel é um combustível derivado de biomassa, obtido a partir da reação de óleos ou gorduras com um álcool, o ‘diesel verde’ é definido pela ANP como biocombustível de hidrocarbonetos parafínicos produzido a partir de quatro rotas tecnológicas, como hidrotratamento de óleo vegetal e animal ou pela fermentação do caldo de cana-de-açúcar.
Combustível de aviação
Arnaldo Jardim defendeu a adição paulatina do chamado combustível sustentável de aviação (Sustainable Aviation Fuel – SAF) no querosene da aviação. Segundo o relator, a expectativa é que o Brasil seja um exportador da bioquerosene.
“Tenho muito entusiasmo, não só pela questão ambiental, mas pela oportunidade de sermos exportadores. O Brasil não só suprirá, mas poderá ser uma grande plataforma de produção do BioQAV [Combustível Sustentável de Aviação]”, declarou. Jardim ressaltou que essa mudança não impactará em grande medida o aumento do preço das passagens aéreas.
Debate em Plenário
Vários deputados subiram à tribuna para defender ou rejeitar a proposta citando a transição energética, a proteção ambiental e a descarbonização da economia. Houve parlamentares, porém, que viram com receio as mudanças.
Segundo o líder do governo, deputado petista José Guimarães (PT-CE), o texto é resultado de negociação de líderes partidários com o governo e significa uma grande conquista para o País. “Dá sinais positivos para o mundo e o Brasil de que este Congresso e o presidente Lula trabalham fortemente para a transição energética e para pensarmos medidas de descarbonização da economia brasileira e de consolidação da economia verde”, afirmou.
O deputado Hugo Leal (PSD-RJ) disse, no entanto, que a ampliação da quantidade de biodiesel poderá ser um “lobo em pele de cordeiro” e prejudicar o transporte de mercadorias no País. “O biodiesel deixa borras, resíduos que comprometem a atividade do caminhão. Temos de ter cuidado. Um projeto que pode ser interessante, com apelo, pode causar impacto no dia a dia das pessoas.”
Segundo o deputado Alceu Moreira (MDB-RS), o risco de agressão aos motores pelo biodiesel não é embasado em laudos técnicos. “Não causa nenhum problema nos motores, de acordo com laudo técnico da Scania [fabricante de caminhões]. Esta é uma política socialmente justa, ambientalmente louvável, é sequestro de carbono”, disse.
Para o deputado Gilson Marques (Novo-SC), o projeto gerará inflação ao aumentar preços de combustíveis sob a bandeira de proteger o meio ambiente. “Não podemos forçar o consumidor, a maioria pobre, a financiar o produto que voluntariamente ele não quer. Se a ideia fosse boa, ela não seria forçada.”
Rejeição
O Plenário rejeitou todos os destaques apresentados pelos partidos. Confira:
– emenda da deputada Erika Hilton (Psol-SP) que pretendia excluir do texto o tema da captura e armazenamento de carbono;
– destaque do PL que pretendia excluir do texto o trecho sobre adição de biodiesel ao diesel;
– emenda do deputado Altineu Côrtes (PL-RJ) que pretendia fixar em 29,5% o limite máximo de adição de etanol à gasolina;
– emenda do deputado Bibo Nunes (PL-RS) que pretendia condicionar a adição de biodiesel ao diesel desde que tecnicamente preservadas as características mecânicas do veículo;
– emenda do deputado Darci de Matos (PSD-SC) que pretendia exigir do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) o exame de viabilidade técnica ao fixar mistura de biodiesel ao diesel entre os limites de 13% e 25%;
– destaque do bloco MDB-PSD que pretendia permitir o uso de biodiesel na adição ao diesel se produzido por outros meios diferentes daqueles dedicados a essa finalidade;
– emenda do deputado Márcio Marinho (Republicanos-BA) que pretendia autorizar a concessão de subvenção econômica, por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no financiamento ao processo produtivo de biogás e biometano.