O governo brasileiro exportou 20 mil frascos de spray de pimenta para a Venezuela nos meses que antecederam as eleições presidenciais de julho deste ano, de acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). A informação foi revelada pela BBC.
Esses produtos, frequentemente usados por forças de segurança para conter manifestações, foram enviados em dois lotes entre junho e julho. A entrega, aprovada pelo Ministério da Defesa e pelo Exército, ocorreu em um momento de crescentes preocupações da comunidade internacional com a repressão política no país comandado por Nicolás Maduro.
Pacaraima, uma cidade brasileira na fronteira com a Venezuela e porta de entrada para milhares de imigrantes que fogem da crise econômica e política, serviu de ponto de passagem para essa remessa. A carga foi transportada de São Paulo até Roraima antes de ser levada ao país vizinho. Essa movimentação não foi amplamente divulgada e ocorreu no período pré-eleitoral venezuelano, quando o país se preparava para um pleito decisivo que poderia encerrar 11 anos de chavismo.
Os protestos que eclodiram após o anúncio da vitória de Nicolás Maduro, em 28 de julho, foram marcados por confrontos e prisões. De acordo com um relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), as manifestações foram duramente reprimidas, com detenções arbitrárias e violações de direitos humanos. A ditadura venezuelana, por sua vez, classificou o relatório como “vulgar” e “panfletário”, acusando-o de ser uma ferramenta a serviço dos interesses dos Estados Unidos.
A exportação de sprays de pimenta, considerada um produto de defesa, segue um processo específico que requer autorização de órgãos governamentais.
Entretanto, para itens classificados como não letais, como o spray de pimenta, o controle é realizado apenas pelo Ministério da Defesa e pelo Exército, conforme uma portaria de dezembro de 2022.
Apesar disso, a venda gerou críticas de organizações de direitos humanos. “É um erro exportar equipamentos, mesmo que não letais, para um regime que tem um histórico recente de repressão violenta contra sua população”, afirmou Bruno Langeani, consultor sênior do Instituto Sou da Paz.
Os 20 mil frascos de spray de pimenta exportados colocaram a Venezuela no topo da lista de compradores desse produto em 2024, superando o Chile, que adquiriu 4 mil unidades. Somadas, as compras de todos os outros países ficaram abaixo de 10 mil unidades, destacando o volume significativo enviado ao regime venezuelano.
As eleições presidenciais na Venezuela, realizadas em 28 de julho, resultaram na reeleição de Maduro, o que gerou forte reação dentro e fora do país. Protestos generalizados tomaram as ruas, enquanto o principal candidato da oposição, Edmundo Gonzales, fugiu do país após sua vitória ser reconhecida por nações como os Estados Unidos.
Embora o governo brasileiro tenha declarado que a exportação seguiu todas as normas, não foram revelados detalhes sobre a empresa responsável pela venda ou sobre a natureza da compra — se realizada por entidades privadas ou pelo regime de Maduro.
Os efeitos do spray de pimenta, embora considerado um item de controle não letal, podem ser severos. Quando aplicado, causa irritação na pele, lacrimejamento intenso e, em casos mais graves, cegueira temporária por até 30 minutos. Prolongada exposição pode impactar permanentemente a sensibilidade da córnea, além de afetar as mucosas do nariz e da boca.
A exportação, realizada em meio à tensão política na Venezuela e aos questionamentos internacionais sobre a legitimidade do governo Maduro, continua gerando debates sobre o papel do Brasil no fornecimento de materiais a regimes com histórico de repressão. Para especialistas, o episódio reforça a necessidade de maior rigor na análise de exportações de itens classificados como materiais de defesa, mesmo que não letais. E mais: Senado trabalha para viabilizar o ‘Drex’, moeda digital brasileira. Clique AQUI para ver. (Foto: EBC; Fonte: BBC)