Ao anunciar seu apoio a Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno da eleição presidencial de 2022, o economista Arminio Fraga surpreendeu parte do meio político.
Ele, porém, diz que nunca alimentou grandes expectativas quanto ao desempenho do petista na condução da economia. Agora, já no terceiro mandato de Lula, Fraga demonstra frustração com os rumos adotados até aqui. “O governo não tem um caminho para o país”, afirmou o ex-presidente do Banco Central em entrevista à revista Veja.
Recentemente, Fraga voltou ao centro do debate público ao sugerir uma medida polêmica: a correção do salário mínimo apenas pela inflação, sem aumento real, durante um período de seis anos.
A proposta, segundo ele, tem como objetivo aliviar a pressão sobre o orçamento federal, já que os dois principais gastos da União — aposentadorias e o Benefício de Prestação Continuada (BPC) — estão vinculados ao valor do mínimo. Com isso, o governo ganharia tempo para avançar em reformas estruturais.
O economista também criticou a postura de Lula em relação ao cenário fiscal do país. Na avaliação dele, a resistência de Lula em reconhecer a gravidade da situação pode ter consequências negativas para a própria gestão. “Se Lula se reeleger, não poderá culpar os outros”, declarou.
Fraga reforçou a necessidade de responsabilidade fiscal e lamentou o que considera uma ausência de diretrizes claras por parte do governo atual para impulsionar o crescimento econômico do país. Veja trechos abaixo da entrevista na íntegra publicada na revista.
O arcabouço fiscal fracassou? Até certo ponto, sim. Lá atrás, minha primeira reação foi de que o arcabouço era uma boa notícia, porque o governo estava encarando o problema. Eu entendo que a Fazenda tinha a intenção de entregar um bom resultado fiscal, mas não depende só dela. O arcabouço foi um bom ponto de partida, mas insuficiente. A questão fiscal está pegando fogo. Se Lula se reeleger, terá de lidar com a sua própria herança. Será difícil botar a culpa nos outros. O fato é que a situação já está difícil, e o ano que vem será de muita pressão de gastos, porque isso é típico de anos eleitorais. Além disso, pelo que já conseguimos ver, 2027 não será nada bom.
Ao mesmo tempo, o governo elevou o imposto sobre operações financeiras. O vício de cobrir rombos com mais arrecadação continua? Foi uma decisão desastrosa. Mesmo que tenha sido parcialmente revista, ficará na memória. Mostra que o foco do ajuste segue no cansado aumento de receitas. Além disso, o IOF é um imposto meramente regulatório, de péssima qualidade. Pressiona os preços e os juros, com impacto social cruel. Sinalizou também controles de câmbio, algo que assusta. Tudo isso pegou mal para o ministro Fernando Haddad. Sem encarar o lado do gasto, o Brasil desperdiçará uma enorme chance de crescer mais. Há muito espaço na Previdência e nos gastos tributários.
O senhor já disse que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, é sinônimo de turbulências. Quanto o Brasil está preparado para este segundo mandato? Não temos opção, a não ser enfrentar quatro anos de turbulência global com Trump. Mas o Brasil reage bem às crises internacionais. Creio que não será diferente desta vez. O que me preocupa é para onde o mundo caminha. Vivemos um momento de transição, de novas hegemonias e de tensões geopolíticas enormes. O Brasil é um país ocidental e não pode abrir mão disso. Então, terá de navegar com habilidade por essa situação.
O senhor se arrepende de ter votado em Lula no segundo turno das eleições de 2022? Não me arrependo, apesar de uma certa decepção. Eu não votei no Lula porque achava que traria um paraíso econômico, mas esperava um pouco mais. O Lula 1 foi muito bom; o Lula 2 não foi tão bom, mas funcionou. Agora, eu vejo um governo que não apresenta um caminho para o país. Mas não me arrependo, porque dar um segundo mandato a Bolsonaro seria uma temeridade.